Falava-se de alguém, alguém, pelos vistos, muito conhecido.
Que se ia muitas vezes a um certa discoteca para o ver. Que era fabuloso.
Depreendi que fosse um DJ.
Quem é o Fulano X?, perguntei eu a colega.
Sorriu e respondeu-me com um "Não sabes quem é Fulano X?! É um dos DJs mais conhecidos de Portugal!".
Eu, impávida e serena (o que é Português correcto para "eu, cagando e andando"), respondi com um "Ahh. Ok. Parabéns para ele".
Continuei na minha vidinha.
Colega vira-se para Super-Fã de "um-dos-DJs-mais-conhecidos-de-Portugal" e diz, rindo-se, "A Sónia não sabe quem é o Fulano X!"
Super-Fã ri-se e pergunta, "Não sabes quem é o Fulano X?! Estiveste fora, foi?!"
E foi aqui, neste preciso momento, que saí do modo "cagando e andando" e entrei em modo "cala-te, respira, e cala-te".
Enquanto se ria em puro gozo, eu calei-me, respirei fundo e calei-me de novo. Depois de cerca de 4 segundos (o que é uma eternidade para responder a pergunta que nos façam), respondi com um "Sim".
Mais risota.
Eu só não respondi como quis por uma razão muito simples: o meu cérebro foi mais rápido e poderoso que as minhas vísceras e, num processo de negociação que durou um cagagésimo de segundo, conseguiu convencê-las a não tomar controlo da minha boca. Principal argumento: Super-Fã não sabe da tua vida, não sabe quem és, não sabe nada de ti, portanto, não podes levar isto como sendo algo pessoal contra ti mas antes veres a questão como sendo uma manifestação qualquer de vaidade (ou maldade) que te soube mal mas que não tens de piorar metendo o teu contexto e história ao barulho.
E continuou:
Vísceras, bem sabemos que esta malta acha que quem não "é de cá" é totó, semi-campónio e totalmente alheio ao que é fixe, cool e trendy (trendy, carai!). Tens duas opções: Ou desatas num monólogo sobre os últimos 7 anos da tua vida com o teu melhor sotaque e expressões Ribatejanas e mais ou menos provas uma certa verdade nessas crenças, ou calas-te e deixas esta malta em paz com as suas inseguranças e certezas tão fáceis de proclamar.
As Vísceras, revoltadas e a pedirem sangue, amansaram. Relutantes, contrariadas, vencidas mas não convencidas, renderam-se ao cérebro e sossegaram.
Calei-me, engolindo as memórias dos últimos 7 anos que, para mim, explicam muito bem o porquê de eu não conhecer um dos DJs mais conhecidos de Portugal, cujas actuações num determinado estabelecimento de diversão nocturna em Lisboa são, dizem, uma loucura.
Calei-me.
O que é que isto tem a ver com estar migrada em Lisboa?
Tudo.
Quem não entender, talvez seja por ser alguém tipo Super-Fã. Talvez. Pelo sim, pelo não, shhhhh.
E, por fim, a quem desejar tomar o caminho da condescendência e dizer algo do tipo "Eh pá, não tomes o todo pela parte", ou "não julgues assim os outros apenas pelo sítio de onde são" ou ainda "estás a ser injusta com toda uma cidade só porque uma das suas pessoas se armou aos cágados", podem recorrer ao silêncio também e, enquanto praticam essa arte, lerem tudo de novo. Mas leiam com olhos de ver. Tudo. Cada linha (é chato, sei). Cada palavra. Se, depois deste pequeno exercício, o que tiverem para dizer vier das vísceras, já sabem: calem-se.