“The older I grow, the more I distrust the familiar doctrine that age brings wisdom.” - H.L. Mencken

27
Dez 17

Sei, por experiência própria, que, se não quisermos saber de algo ou alguém, então, nem que três vacas tussam o hino nacional enquanto descem a Serra da Estrela de trenó, nada nem ninguém nos vai demover dessa falta de sentimento ou emoção. 

Há livros escritos sobre o tema da motivação e sobre como ser líder influencia o que os outros fazem e sentem. Há vidas inteiras dedicadas ao estudo e tentativa de compreensão dessas merdas. Não era preciso. 

Pergunte-se às pessoas pelo que querem saber ("what do you care about?") e facilmente descobrirão as suas motivações e, consequentemente, forma de as manter motivadas e felizes e felizes por estarem contentes.



Em Lisboa, creio que seja isso. As pessoas não querem saber. Simplesmente não querem saber.



Sinal vermelho? Quero lá saber, passo na mesma! Quem me vai impedir?



Estrada com carros a passar a 50 à hora? Quero lá saber! Vou-me atirar para cima desta passadeira e eles têm de parar!

Alguém a desfalecer encostado a uma parede? Pfff! Nem conheço! Quero lá saber!



Desviar-me, num passeio cheio de gente, criando espaço para que ninguém se tenha de atirar para a estrada/contra uma parede? Quero lá saber! Chegassem mais cedo!



Pode até ser que seja nas grandes cidades que todo este "não quero saber" melhor se veja devido ao stress e rapidez com que a vida por aqui acontece. Pode até ser que seja nas grandes cidades que o stress e rapidez com que a vida por cá se vive seja devido ao "não quero saber" de quem por cá passa. Pescadinha de rabo na boca e, por mais, cheia de fome. 



Talvez seja aqui, sobe esta luz intensa que amplia tudo e torna tudo mais evidente, que se veja o tal estado a que chegámos. Ou talvez o estado a que chegámos seja ele próprio essa luz que tudo queima. 



Não sei.



Só sei que todos os dias, salvo raras excepções, olho à volta e não vejo ninguém feliz. São estados ausentes que conduzem os carros pelo trânsito, que mexem pernas pelas ruas. São olhos vidrados que olham os prédios históricos e mãos adormecidas que seguram os sacos cheios de enche-almas em forma de bens materiais. São pés que não sentem o chão que pisam e, algures ali pelo meio, peitos vazios e ocos que em tempos souberam o que era estarem cheios e a arrebentar de algo. Há um permanente estado de letargia a atirar-se para a irritação que se sente no ar. Não se pode acordar ninguém do seu sono acordado. As consequências podem ser violentas, especialmente para quem e arrancado do seu ó-ó.



 

Há uns tempos, poucos, fui de boleia a um sítio no meu Ribatejo. Sentei-me no banco de trás e pus-me a olhar para a paisagem que, de resto, já vi mil vezes. Paisagem livre, verde, onde se vê o céu e onde, à noite, se vêem estrelas. Campos roliços, montes cuidados, arvoredo bonito que parece estar ali apenas para proteger a terra de onde nasceu. Pessoas rijas, duras, de confiança e cheias do tal sentimento que a tantas falta - elas querem saber.



Eu sou daqui, disse baixinho. Eu sou disto. Eu sou isto.



É disto que quero saber. É isto que me move e comove. É isto que me deixa em mim.



 

Eu reparo nos prédios, desvio-me das pessoas, páro nos sinais vermelhos, faço pisca e dou passagem a peões. Mas, sinceramente, não quero saber. Só o faço para que não me arranquem do meu sono acordado e me obriguem a estar mesmo cá.

publicado por Sónia às 10:08

18
Dez 17

- Não interessa a que velocidade fazes a Recta do Cabo. Quando chegares à ponte de VFX, os carros que ultrapassaste a 200 à hora vão estar mesmo atrás de ti na mesma.
- Por vezes, aquele sentimento de instinto é mesmo só gases.
- Seja onde for que te cortes e por muito pequeno que seja o corte, vai-te sempre atrapalhar e incomodar como se te tivessem arrancado um braço.
- O sol brilha mais forte quando te esqueces dos óculos em casa/carro/café/etc.
- Pensares que precisas de ter tudo preparado ou pronto para começares algo é caca de boi. Faz o que puderes, com o que tiveres, conforme puderes, quando puderes. Começado é melhor que estratégicamente delineado e planeado com deadlines e KPIs e o raio que os parta a todos.
- Um plano de negócio vale zero. Aliás, menos que zero. Se algum dia te der para o empreendedorismo e potencial investidor/parceiro/etc te pedir um, foge. Será usado contra ti a cada oportunidade que surja e, por mais, não vais conseguir explicar nada do que lá está (a adivinhologia ainda não é ciência).
- Nunca estaciones naquele lugar livre que ninguém aproveita numa zona cheia de trânsito e à pinha de gente. Nunca.
- Sim, só vais reparar que não tens papel higiénico no pior momento possível (sim, vais puxar cuecas para cima até mais ou menos meio caminho para ires em busca de papel/algo semelhante, por muito má cara que faças e por muito de perna aberta que seja o teu andar).
- Só vais descobrir que as tuas botas deixam entrar água se andares com elas à chuva.
- Sim, a peça de fruta no fundo da taça estará podre.
- Não, aquilo não vai descongelar até à hora que precisares.
- Não, não vais dormir até tarde quando o puderes fazer.
- Não, não te vais deitar mais cedo quando o devias fazer.
- Não, a opinião dos outros não vale um chavo.
- Não, a opinião dos outros não vale um chavo (a não ser que seja a tua Mãe e, mesmo assim...)
- Não, a opinião dos outros não vale um chavo (a não ser que seja o teu Pai e, mesmo assim...)
- Não, a opinião dos outros não vale um chavo (a não ser que seja alguém a quem entregarias a alma enquanto fosses de férias ou coisa assim e, mesmo assim...).
- Sim, consegues aprender TUDO no youtube.
- Sim, também tu és um idiota chapado/a de vez em quando.
- Sim, vais acabar por almoçar/jantar cereais muitas mais vezes do que tinhas previsto para a tua vida.
- Não, nunca o vais admitir à tua Mãe.
- A função "reset password" é melhor do que terem inventado nutella.
- Para os gajos - não, se fosses gaja não irias andar sempre a levar no pito.
- Para as gajas - não, se fosses gajo não irias ser mais compreensivo, lavadinho, arrumadinho, amável e doce.
- Se não perguntares, nunca saberás.
- Sim, alguém votou neles.
- Os sinais de aviso de trânsito lento nas auto-estradas não são sinais de aviso - são ordens.
- Sim, mais tarde ou mais cedo, vais ter medo de fazer algo. Faz na mesma, mesmo com medo. Os medos gerem-se e conquistam-se mas não desaparecerem totalmente. Habitua-te.
- As hipóteses de encontrar culpado/culpada por algo ter corrido mal/partido/sido destruído serão inversamente proporcionais à gravidade da merda feita.
- Por falar em merda, sim, vai cheirar mal. Aguenta-te e manda os outros, lá está, à merda, se te chatearem os cornos.
- Por falar em cornos... Sim, vais tê-los. Poderás não saber quando, como ou de que modo mas, sim, vais tê-los. Mais tarde ou mais cedo, terás testa enfeitada. É a vida.
- Tempo, não dinheiro, é o teu bem mais precioso.
- Tempo, não dinheiro, é o teu bem mais precioso.
- Tempo, não dinheiro, é o teu bem mais precioso.
- Tempo, não dinheiro, é o teu bem mais precioso.
- Tempo, não dinheiro, é o teu bem mais precioso.

Pronto. Era isso.

publicado por Sónia às 11:04

É bem possível que a nossa capital seja o sítio mais propício à demonstração de um grave problema que assola Portugal e as suas gentes – a falta de capacidade de compromisso com seja o que for, quando for, onde for.
Ao nível macro, há muitas e fortes evidências deste flagelo. Vejamos:
- Quem votou nos cabrões no Governo (aplicável desde sempre e a todos os governos)?
Resposta: Ninguém (“eu não votei neles!”, “quem votou neles é que devia ser obrigado a fazer o que dizem!”, “eu nem fui votar!”, “eu votei nulo!”, “eu votei no meu primo Vitó!”, etc.)
- Quem entope as urgências dos hospitais e centros de saúde com situações menores?
Resposta: Eles! São eles, os tansos! Apanham uma constipação e tungas, Santa Maria com eles!, etc.
Mais exemplos há sobre a importância (e culpa) de figuras tão importantes como o Ninguém e o Eles, mas, o tempo urge e este post já vai longo (um cadinho, vá).
Passando para o nível micro, temos situações que também indiciam a falta de compromisso que assola este país. Ora...
- Quem comeu as bolachas que deixei em cima da minha mesa?
Resposta: Eu não fui! (o que dá para traduzir por “ninguém”)
- Quem acabou com o papel higiénico e não substituiu?
Resposta: Ninguém! (a malta até só caga em casa e aquele cheiro que por vezes se sente é dos esgotos).
- Quem foi a última pessoa a sair e deixou as luzes acesas?
Resposta: Ninguém (no entanto, se a pergunta fosse feita com apenas a sua primeira parte, haveria muito boa gente a levantar o bracinho pensando que estavam a fazer boa figura).
Mas a situação que mais indicia esta incapacidade para o compromisso é o flagelo do Pisca-que-nunca-o-é.
Eu explico.
Em Lisboa, existe agora uma moda que possui duas fações.
Ambas contestam o apropriado uso dos piscas para assinalar uma qualquer manobra mas uma é totalmente hardcore, purista e pouco disposta a alterar a sua forma de agir, enquanto que a outra é um pouco mais soft, mais adaptável, mais branda, mas igualmente pouco disposta a alterar a sua forma de agir.
A primeira é a que pura e simplesmente não faz pisca.
Quando empreendem uma qualquer manobra, empreendem-na e pronto. Há um espacinho entre aqueles dois carros numa fila que anda a 5 ou a 120 à hora? É para lá que desviam o carro sem dar pêva a ninguém.
Questionados sobre esta atitude, dirão: Eu?! Eu faço sempre pisca! E até parece que não havia espaço! Até parece que a estrada não é de todos! Fascistas, pá! É por essas e por outras que Portugal está onde está! Fascistas!!
A segunda é a que tem o centro de tomada de decisão do cérebro ligado directamente à mão esquerda. Para estes, a decisão de manobrar o veículo para outra faixa/rua/etc possui acção imediata sendo a decisão tomada, o pisca accionado e o veículo manobrado - tudo em simultâneo.
Questionados sobre esta atitude, dirão: Atão mas eu não fiz pisca, querem ver?! Eu faço sempre pisca! E até parece que não havia espaço! Até parece que a estrada não é de todos! Fascistas, pá! É por essas e por outras que Portugal está onde está! Fascistas!!

Se nem com a porra de uma manobra devidamente assinalada nos conseguimos comprometer ou assumir essa responsabilidade perante os outros, como nos vamos comprometer com o resto? Como esperam que o resto seja melhor quando, no caso dos piscas, há malta a morrer e mesmo assim, as duas fações mantêm as suas posições?
USEM A MERDA DO PISCA, PORRA. QUAL É A DIFICULDADE?! QUAL?!
Nenhuma, querem ver?
E são apenas “eles” que não fazem, né?
Ninguém iria colocar os outros assim em perigo, né?
Pois.
É o costume.

publicado por Sónia às 11:04

Dou-vos um exemplo simples disto.
Eu falo inglês (e escrevo, leio e penso em inglês também). Para além de ter aprendido a ler e escrever (no geral) em inglês, mantenho um bom ritmo de manutenção da coisa lendo muitos livros, em inglês, e chamando muitos nomes feios, em inglês, às pessoas que fazem asneiras no trânsito. Inglês é algo tipo tu cá, tu lá para mim.
Anyway...
De vez em quando, colocam-me questões sobre o inglês porque sabem que eu e o inglês é algo tipo tu cá, tu lá. Justíssimo.
Se sei-lá-o-quê se diz assim ou assado, se sei-lá-o-quê-II se escreve assado ou frito, etc. E eu respondo, explicando de forma simples o porquê da minha resposta.
Quase invariavelmente, recebo olhares desconfiados e/ou afirmações tipo "Oh. É nada!", "Mas e se...", "Mas eu não aprendi assim...", "Mas eu achava que...", etc.
Dantes, quando ainda me ralava e não tinha percebido ainda o que está descrito ali na espécie de título deste post, ainda me dava ao trabalho de argumentar, demonstrar, dar mais exemplos - valia quase tudo até que a pessoa ficasse convencida do que estaria a dizer e reconhecesse o erro do seu caminho.
Houve também a fase de puxar pelos galões, depois de todo o resto falhar, e fazer perguntas tipo "Quantos anos viveste na Austrália?", "Qual foi a nota que tiraste no exame Cambridge?", "A quantas pessoas dás aulas?", "E business english, ensinas?", etc. Era, admito, uma espécie de over-kill (vão ao google) que deixava a outra pessoa vencida (mesmo que não convencida) e que me deixava a mim fucking pissed off (conjugação interessante impossível de traduzir para o português).
Foi quando percebi que as pessoas se estavam pouco a cagar (infelizmente, esta não dá para traduzir como deve ser para inglês) para a verdade ou a resposta às suas questões. O que queriam mesmo era que alguém supostamente entendido confirmasse o que elas achavam, pensavam e opinavam.
Daí em diante, a minha vida mudou.
Ao primeiro argumento contrário ao que eu teria dito, passei a responder com um "'Tá bem". Mais nada. Fim de discussão. Next!
(de vez em quando, quando sei que a pessoa não sabe que eu e o inglês é algo tipo tu cá, tu lá, atiro com um "ahh, pois, por acaso é uma das situações que analisamos muito nas minhas aulas..." e deixo a coisa sink in - e não on, já agora).
Há quem desconfie desta minha recusa em seguir para a luta e veja nisso o acto máximo de certeza, de firmeza, desconfiando ainda mais de tanta simpatia pelo adversário. Aceitam, fazem perguntas inteligentes e, de vez em quando, até aprendem algo novo.
Mas há quem se dê por satisfeito com o meu deitar de armas, quase como se me tivessem vencido, a mim, à perita da coisa e, de sorrisinho orgulhoso e com mais meio palmo de altura, ainda acrescentam algo do género "pois, bem me parecia".
'Tá bem, respondo de novo, com sorrisinho tipo crocodilo brincalhão, matando ali mesmo a minha colaboração da cena.
Que bem se está neste mundo de peace (que é diferente de piece ainda que se pronunciem da mesma forma, já agora).

Tirem as vossas próprias ilações deste texto, desta mensagem. Por mim, 'tá bem. 'Tá tudo bem.

publicado por Sónia às 11:03

Falava-se de alguém, alguém, pelos vistos, muito conhecido.
Que se ia muitas vezes a um certa discoteca para o ver. Que era fabuloso.
Depreendi que fosse um DJ.
Quem é o Fulano X?, perguntei eu a colega.
Sorriu e respondeu-me com um "Não sabes quem é Fulano X?! É um dos DJs mais conhecidos de Portugal!".
Eu, impávida e serena (o que é Português correcto para "eu, cagando e andando"), respondi com um "Ahh. Ok. Parabéns para ele".
Continuei na minha vidinha.
Colega vira-se para Super-Fã de "um-dos-DJs-mais-conhecidos-de-Portugal" e diz, rindo-se, "A Sónia não sabe quem é o Fulano X!"
Super-Fã ri-se e pergunta, "Não sabes quem é o Fulano X?! Estiveste fora, foi?!"
E foi aqui, neste preciso momento, que saí do modo "cagando e andando" e entrei em modo "cala-te, respira, e cala-te".
Enquanto se ria em puro gozo, eu calei-me, respirei fundo e calei-me de novo. Depois de cerca de 4 segundos (o que é uma eternidade para responder a pergunta que nos façam), respondi com um "Sim".
Mais risota.

Eu só não respondi como quis por uma razão muito simples: o meu cérebro foi mais rápido e poderoso que as minhas vísceras e, num processo de negociação que durou um cagagésimo de segundo, conseguiu convencê-las a não tomar controlo da minha boca. Principal argumento: Super-Fã não sabe da tua vida, não sabe quem és, não sabe nada de ti, portanto, não podes levar isto como sendo algo pessoal contra ti mas antes veres a questão como sendo uma manifestação qualquer de vaidade (ou maldade) que te soube mal mas que não tens de piorar metendo o teu contexto e história ao barulho.

E continuou:
Vísceras, bem sabemos que esta malta acha que quem não "é de cá" é totó, semi-campónio e totalmente alheio ao que é fixe, cool e trendy (trendy, carai!). Tens duas opções: Ou desatas num monólogo sobre os últimos 7 anos da tua vida com o teu melhor sotaque e expressões Ribatejanas e mais ou menos provas uma certa verdade nessas crenças, ou calas-te e deixas esta malta em paz com as suas inseguranças e certezas tão fáceis de proclamar.

As Vísceras, revoltadas e a pedirem sangue, amansaram. Relutantes, contrariadas, vencidas mas não convencidas, renderam-se ao cérebro e sossegaram.

Calei-me, engolindo as memórias dos últimos 7 anos que, para mim, explicam muito bem o porquê de eu não conhecer um dos DJs mais conhecidos de Portugal, cujas actuações num determinado estabelecimento de diversão nocturna em Lisboa são, dizem, uma loucura.
Calei-me.

O que é que isto tem a ver com estar migrada em Lisboa?
Tudo.
Quem não entender, talvez seja por ser alguém tipo Super-Fã. Talvez. Pelo sim, pelo não, shhhhh.

E, por fim, a quem desejar tomar o caminho da condescendência e dizer algo do tipo "Eh pá, não tomes o todo pela parte", ou "não julgues assim os outros apenas pelo sítio de onde são" ou ainda "estás a ser injusta com toda uma cidade só porque uma das suas pessoas se armou aos cágados", podem recorrer ao silêncio também e, enquanto praticam essa arte, lerem tudo de novo. Mas leiam com olhos de ver. Tudo. Cada linha (é chato, sei). Cada palavra. Se, depois deste pequeno exercício, o que tiverem para dizer vier das vísceras, já sabem: calem-se.

publicado por Sónia às 11:02

Entrei no Metro e reparei em três rapazes sentados juntos. Tinham o quê, uns 18 anos? Um deles, de costas para mim, tinha os pés em cima do banco em frente. Coloquei-me ao lado do banco e aguardei que tirasse os pés para me sentar. Havia muitos lugares vagos na carruagem mas eu entrei em modo kill e nem pensei duas vezes.
Olho para o dono dos pés.
O dono dos pés olha para mim.
Abre muito os olhos e retira os pés do banco.
Sentei-me.
Sorrio com a simpatia de um crocodilo.
"Há dias de azar, né?", digo-lhe.
"Não, não é azar. Posso ir para aqueles lugares e meter os pés em cima dos outros bancos...", responde ele, reconhecendo-me.
Continuei a olhá-lo.
"... Mas não o vou fazer. Já aprendi".
Mantive-me fixa nele com sorriso ligeiramente mais simpático.
Ao lado, os dois amigos tentavam não rir.
Sairam na paragem seguinte.
Parece que o Cabrão de Merda tem azar. E já aprendeu a lição.
Venha o próximo. Um de cada vez. Um de cada vez.

publicado por Sónia às 11:01

Ao cabrão de merda com aí uns quê, 18 anos?, que há bocado esfregava a sola dos seus ténis contra o rebordo do banco do metro à sua frente e que me disse "São oito da manhã e já me está a chatear com isso?!" quando olhei para ele, para os pés dele, e de novo para ele (ao menos é perspicaz), vai à merda. E leva quem te educou contigo. E leva quem assim o permitiu também. E leva todos aqueles que nunca te disseram nada em relação ao cabrão de merda que és porque não se pode dizer nada ao menino. Vão todos para parecerem muitos.
Teres dito que não era eu lá sentada e que quando chegasse alguém tiravas o pé apenas prova o egoísmo e narcisismo, o sentido de impunidade que pensas ter no mundo. Se alguém te disser alguma coisa (o que duvido que façam com frequência), fazes algo. Se não, é continuar porque tu é que sabes, né bebé? Vai à merda.
Quanto ao teres-te calado quando te disse que não sabias onde estavas sentado, que mais alguém já podia ter feito exactamente o mesmo, vai à merda também. E leva de novo todos os outros contigo. E uns pauzinhos.
Quanto às outras pessoas que nada disseram mas viram, podem ir com o cabrão de merda também. À Senhora que, olhando, disse baixinho e falando para mim (e não para ele!!) "pois, deve fazer o mesmo em casa", tome o seu lugar na fila e vá também.
É parvo, sei, ficarmos chateados com estas coisas. É parvo vir para aqui reclamar. Mas sabem porque é que é parvo? Sabem mesmo? Porque há-de haver quem diga "pois... hoje em dia, é tudo assim..." como se tal fosse algo que tivesse caído do céu e ninguém pudesse impedir ou controlar. É por esse motivo que se acha que é parvo - porque não há nada a fazer, tipo cala-te e come.
"Hoje em dia é tudo assim" porque queremos, deixamos e, suspeito, gostamos. Sermos displicentes para com os outros é mais fácil. Ter que ouvir um gaiato de 18 anos a respingar e refilar, armado em durão que não é, não é bom. Dá vontade de lhe partir a boca. É difícil não desatar aos gritos e insultar toda a sua ascendência até à 10ª geração. Custa, pá. E por mais, às 8 da manhã quando uma boa dose de insultos faz ganhar ânimo para o resto do dia.
Tu, cabrão de merda de 18 anos com as solas dos ténis imundas, és a cara cheia de acne que representa o caminho que estamos a levar. Temo que, se ninguém te partir os dentes antes, isto não vá correr muito bem.
Portanto, gente, da próxima vez que tiverem o poder de ao menos tentar manter esta merda no caminho certo, não ignorem, não olhem para o lado, não pensem que nada tem a ver convosco. Tem. E muito. Tanto é ladrão quem rouba como quem fica à espreita. E tanto é porco quem suja como quem nem se rala com isso.
Merda.

publicado por Sónia às 11:00

Dantes, porque era gozada, tentava disfarçar o meu sotaque. Hoje em dia, estou-me pouco nas tintas para isso. 

És de onde?, perguntam quando reparam em algo não bem certo comigo.
E eu, fiel ao princípio que afirma que o verdadeiro Lisboeta não passa para lá de Sacavém sem passaporte, respondo em voz embargada, pesada, sofrida.
Samora Correia..., deixo eu no ar, com olhos semi-cerrados como se a própria menção das palavras me causasse dor.
Quase sempre, quase, a resposta vem em forma de pergunta: Onde?
E eu, também fiel ao princípio que diz que se assumes um personagem, mantém-o até ao fim, respondo: Pois... Se nem sabe onde fica ou ouviu falar, imagine!
Do outro lado, um abanar de cabeça compreensivo, de lamento, de empatia.
Eu já não me ralo em mudar o sotaque. Esta malta de Lisboa pode chamar-me campónia (como faziam) à vontade. Sei que há todo um mundo que nos separa nos 50 kms de estrada que faço todos os dias.

publicado por Sónia às 11:00

As pessoas atiram-se para cima das passadeiras sem abrandarem o passo. Já estive para puxar um senhor pela camisa, assustando-me com a facilidade com que se atirou do passeio para a estrada sem olhar, sem hesitar, sem pensar sequer.
As pessoas saem dos lugares de estacionamento e atiram-se para a estrada sem mais, nem menos, quanto mais com pisca aberto.
As pessoas mudam de faixa de rodagem, atirando-se para cima dos outros carros sem a mais leve dúvida sobre se teriam opção de tal ou não, sobre se teriam espaço para tal ou não. Tudo feito, claro, sem mais, nem menos, quanto mais com pisca.
No metro, as pessoas atiram-se para a frente de outras para entrarem e saírem primeiro das carruagens. Nos torniquetes, furam a fila, atirando-se para a frente de alguém que se distraia por um segundo que seja.
Nos autocarros, as pessoas atiram-se para dentro dos mesmos sem considerar quem já lá está ou que as portas tenham de fechar para que ande.
Nas passadeiras, as pessoas atiram os seus carros para cima do chão pintado, impedindo a passagem dos peões. Aquele meio metro, aqueles dois metros, devem ser preciosos, devem ser a diferença entre a vida e a morte. Talvez daí o fazerem tanto?

Em Lisboa, é tudo muito atiradiço. Eu, menina pacata de terra onde quem se atira assim arrisca-se a ser mesmo atirado para outro sítio, ainda não consegui deixar de me irritar, zangar e decepcionar com tanto atiradiço e atiradiça a fazerem-se ao piso.
Lisboa, por enquanto, o que mais gosto de ti continua a ser a estrada que me devolve ao sítio e pessoas de onde sou.
Vê lá disso, se fizeres favor.
Agradecida.

publicado por Sónia às 10:59

Continuem a libertá-los uma, duas, cinco, nove vezes cada, Srs. Juízes.
Continuem a fingir que não sabem, vocês que os conhecem.
Continuem a encobrir tudo, vocês que ganham com isso.
Continuem a protegê-los, vocês que sabem quem fez o quê.
Continuem a arriscar o futuro do país, vocês que só plantam para colher euros.
Continuem a culpar a falta de meios, vocês que os organizam.
Continuem a culpar a falta de formação, vocês que os treinam.
Continuem a olhar para o lado, vocês que sabem e calam.
Continuem a culpar a falta de dinheiro, vocês que o esbanjam.
Continuem a pensar que não têm nada a ver com isto, vocês que decidem.
E a vós, os que fazem isto acontecer, desejo-vos longa e saudável vida. Tão longa que possam conhecer, em pessoa, todas as vidas que nunca mais foram as mesmas porque vocês tiveram um dia mau ou não souberam controlar um ímpeto nervoso, tão longa que possam tomar conhecimento e ver tudo o que morreu e desapareceu por vossa culpa, tão longa e saudável que chegue o dia em que ninguém mais continue a fazer o que tem feito para que vocês sejam os donos e senhores deste país de cinza.
Continuemos.

publicado por Sónia às 10:58

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